ESG

Projeto de Lei do Combustível do Futuro é aprovado na Câmara

Texto agora vai para o Senado; projeto teve alterações envolvendo mistura de biodiesel e programa de biometano

 

A Câmara dos Deputados acabou de aprovar o PL do Combustível do Futuro, importante proposta do governo federal que tramitava havia seis meses na Casa.

O texto teve 429 votos a favor, 19 contra e três abstenções, e agora será encaminhado para avaliação no Senado. O projeto final traz mudanças em relação à versão que havia sido enviada pelo governo, em setembro. 

Entre as principais alterações estão a inserção de metas para a mistura de biodiesel ao diesel de origem fóssil e a criação de um programa para estímulo ao biometano.

As mudanças não são uma novidade por completo. No fim de fevereiro, o relator da proposta, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), já havia apresentado seu parecer, sugerindo alterações na proposta.

A recepção havia sido difusa. Detalhes do texto haviam incomodado alguns setores, especialmente de petróleo e gás. Integrantes do governo teriam ficado insatisfeitos com a possibilidade de perda de poderes envolvendo a mistura do biodiesel, prevista no relatório de Jardim.

Biodiesel

O relatório apresentado originalmente por Jardim sugeria que fossem alterados os percentuais de misturas obrigatórias de etanol e biodiesel.

A mudança envolvendo o etanol anidro à gasolina, podendo chegar a um percentual máximo para 35%, foi mantida.

Mas houve mudanças em relação à quantidade de biodiesel adicionado ao diesel vendido ao consumidor final.

Jardim havia sugerido que a mistura obrigatória, hoje de 14%, começasse a subir um ponto percentual a cada ano, até atingir 20% em 2030, passando para 25% a partir de 2031.

O texto aprovado mantém esse calendário, mas ele deixa de ser obrigatório e passa a ser uma meta a ser alcançada nos próximos anos.

A avaliação final das metas ficará a cargo do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), liderado pelo Ministério de Minas e Energia e ligado diretamente ao governo.

 

Fonte: https://www.g20.org/pt-br/noticias/sustentabilidade-move-o-g20-brasil

Sustentabilidade move o G20 Brasil

Carros movidos a etanol e híbridos, que funcionam também com energia elétrica, vão transportar as delegações internacionais durante os eventos do G20. Acordo entre o Ministério das Relações Exteriores e a Unica reforça o protagonismo do Brasil em transições energéticas e garante o uso de energias renováveis e limpas como combustível da frota oficial do G20.

 

Apenas veículos híbridos e flex serão utilizados no transporte das delegações oficiais que participarão dos eventos do G20 Brasil ao longo do ano. O Ministério das Relações Exteriores (MRE), fechou um acordo de cooperação com a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) para disponibilizar os veículos  nas reuniões do G20 durante a presidência brasileira do Grupo. 

A iniciativa será lançada durante a reunião de chanceleres que acontece no Rio de Janeiro, nos dias 21 e 22 de fevereiro, e reforça a necessidade e importância do uso de fontes limpas de energia, como o etanol brasileiro, conhecido por reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa. 

O evento do Rio contará com cerca de 80 veículos, movidos a etanol. Após a reunião, a frota seguirá para São Paulo, onde fará o transporte das delegações participantes da reunião de ministros das Finanças e presidentes de Bancos Centrais do G20, entre 26 e 29 de fevereiro.

A cooperação prevê a expansão da frota ao longo de 2024, de forma a aumentar o percentual de carros movidos exclusivamente a etanol e de veículos híbridos-flex (que também utilizam energia elétrica). O uso destes carros deve atingir seu ápice na Cúpula do G20, que reunirá os chefes de Estados e de Governo das maiores economias do planeta, nos dias 18 e 19 de novembro, no Rio de Janeiro. 

Prioridade brasileira

A promoção do desenvolvimento sustentável, justo e inclusivo é uma das prioridades da presidência do Brasil para o G20, país que tem a matriz energética mais renovável entre as maiores economias do mundo. 

“O etanol é um produto 100% brasileiro. Enquanto o mundo ainda caminha para o desenvolvimento de ações para a mobilidade que reduzam as emissões de CO2, o Brasil tem pronto um biocombustível sustentável que é utilizado por sua população há décadas”, destacou o presidente da Unica, Evandro Gussi. 

O Brasil produz e utiliza biocombustíveis há cerca de 40 anos, contribuindo de forma significativa para a redução das emissões do setor de transporte. Além disso, o país utiliza um dos maiores percentuais de etanol na composição de sua gasolina. Segundo estimativa da Agência Internacional de Energia, o mundo precisaria triplicar a oferta de biocombustíveis até 2030, a fim de zerar as emissões líquidas de gases de efeito estufa no setor de transportes. Nesse sentido, a produção global teria que crescer, em média, 17% ao ano, pelos próximos seis anos.

A parceria entre o MRE e a Unica foi estabelecida no contexto da Aliança Global para Biocombustíveis, lançada à margem da última Cúpula do G20, em setembro de 2023, na Índia. A Aliança reúne 19 países e 12 organizações internacionais, com o objetivo de fomentar globalmente a produção sustentável e o uso de biocombustíveis. Seu lançamento contou com a participação de Brasil, Estados Unidos e Índia, os três principais produtores de etanol.

 

 

Fonte: https://www.g20.org/pt-br/noticias/sustentabilidade-move-o-g20-brasil

Em fábrica da Natura no Pará, um caminho para a bioeconomia na Amazônia

Planta aponta uma solução para o desenvolvimento sustentável em comunidade que carece de opções – mas replicar o modelo não é trivial

Por Italo Bertão Filho

 

Santo Antônio do Tauá (PA) – A Natura inaugurou em fevereiro a primeira agroindústria de óleos essenciais dentro de seu universo de comunidades fornecedoras da Amazônia. A planta de Santo Antônio do Tauá (na foto acima), a 56 quilômetros de Belém, no Pará, promete mudar a vida de cem famílias da região.

Os produtores já vendiam plantas como capitiú, estoraque, pataqueira e priprioca – utilizadas em produtos da linha Ekos –, mas sempre para um intermediário, responsável pelo processamento.

A implantação de uma estrutura industrial, ainda que de pequeno porte, no meio de uma região extrativista representa uma mudança significativa no modo de produção local.

 

A matéria-prima bruta agora passa por um tratamento inicial da própria comunidade de Campo Limpo. A expectativa é que sejam processadas cerca de 150 toneladas anuais de cultivos locais.

Das 48 comunidades amazônicas com as quais a Natura mantém contratos de fornecimento, 18 já possuem agroindústrias. Nem todas foram construídas em parceria com a companhia, mas a ideia da empresa é cada vez mais levar a agregação de valor para perto de onde vêm os insumos.

Essa transformação da agricultura familiar costuma ser apontada como uma das chaves para o desenvolvimento sustentável na região. Mas a tarefa não é simples. Mudar a realidade dos pequenos agricultores exige dinheiro e conhecimento.

Isso sem contar a infraestrutura básica de água e luz e esgoto, bem como a logística: a produção precisa ser escoada, um problema especialmente complicado para populações remotas ou somente acessíveis por rios.

O modelo não é facilmente replicável, diz o pesquisador Marcelo Elias dos Santos, que estudou a relação entre comunidades e a Natura em sua tese de doutorado defendida na Universidade de São Paulo (USP).

“Toda comunidade tem a sua história, o seu patrimônio genético e a sua biodiversidade. Cada uma tem suas peculiaridades de manejo, gente e volume de produção”, pontua ele.

Ainda assim, a pequena planta de Campo Limpo, no município de Santo Antônio do Tauá, mostra um caminho – e também os desafios – para uma bioeconomia amazônica sustentável.

Garantia de fornecimento

A Natura não revela o valor do investimento, mas o custo estimado para a implantação de uma agroindústria básica pode chegar a cerca de R$ 1,5 milhão, nas contas do gerente-sênior de suprimentos da companhia, Mauro Corrêa da Costa.

A contrapartida é a preferência na compra da produção, mas a fábrica também pode fornecer para terceiros. “Para você praticar o biocomércio ético você não pode exigir um contrato de exclusividade”, explica Costa.

O acesso às matérias-primas da floresta é importante, mas não é o fator decisivo, diz João Moura, vice-presidente de suprimentos da Natura. A diferença está nas fórmulas e no processo de fabricação.

Para as cerca de cem famílias da região, o benefício tem várias dimensões. O primeiro é o aumento de renda. A Natura estima que, com o processamento das plantas, a receita bruta cresça 60%, passando de R$ 800 mil anuais hoje para R$ 1,3 milhão.

Além das espécies nativas usadas nos cosméticos, o plantio de hortifrutis orgânicos é o outro motor da economia local.

Contenção do êxodo

Como em tantas outras comunidades daquela área, a perspectiva da vida difícil no campo leva as nova gerações a buscar alternativas, às vezes bem longe dali.

“Parece que todo paraense quer ir para Santa Catarina”, diz Dilma Lopes, presidente da Aprocamp, a associação local de produtores rurais que administra a fábrica. Ela fala em tom de brincadeira, mas na região esse é um problema real.

Evitar a migração dos jovens para cidades maiores, no Pará ou em outros Estados, é um dos impactos esperados com a planta de processamento.

A agroindústria deve gerar mais 25 empregos na comunidade – hoje, são 75 pessoas envolvidas no fornecimento de matérias-primas da Natura. E boa parte desses postos devem ser ocupados por descendentes dos fundadores da associação.

Lopes diz que a permanência dos jovens no local e a transferência de conhecimento de geração a geração é a concretização do sonho dos fundadores da comunidade, que começou a se formar ainda na década de 1980.

“Nossos filhos, netos, estão aqui na nossa comunidade, acreditaram no trabalho, acompanharam os nossos fundadores. Eles estão acreditando cada vez mais [na perenidade das atividades]”, afirma ela, também filha de um dos pioneiros.

Plantas como a de Campo Limpo ainda são poucas no Pará, disse ao Reset o secretário de Agricultura Familiar do Estado, Cássio Pereira. Ele afirma que há um movimento se formando.

“Na Transamazônica, temos exemplos de fábricas de chocolate organizadas por cooperativas. No sul do Pará, temos agroindústrias de frutas.”

No ano passado, o governo estadual lançou um plano de bioeconomia que contempla a inserção das agroindústrias no universo da agricultura familiar.

Algumas iniciativas já existem, como os programas Pró Cacau e Pró Açaí, para o desenvolvimento de cadeias produtivas.

* O repórter viajou a convite da Natura

 

Fonte: https://capitalreset.uol.com.br/transicao-energetica/transportes/raizen-e-byd-se-unem-para-criar-pontos-de-recarga-de-carros-eletricos/

Raízen e BYD se unem para criar pontos de recarga de carros elétricos

Serão 600 pontos em postos Shell de oito capitais em três anos, com mais de 18 MW de potência instalada

Por Ilana Cardial

 

Raízen e a BYD fecharam uma parceria para aumentar os pontos de recarga de veículos elétricos do Brasil. Serão instalados 600 novos pontos em postos Shell, com mais de 18 MW de potência instalada, em oito capitais do país nos próximos três anos, conforme comunicado ao mercado nesta manhã.

Os eletropostos começarão a ser implementados a partir de 2024 nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Florianópolis, Salvador e Belém. A expectativa da Shell é que seus hubs de recarga elétrica estejam presentes em todo território nacional até 2025.  

A energia utilizada será 100% renovável. O acordo foi feito por meio da Raízen Power, braço de soluções de energia elétrica renovável da Raízen criado em maio do ano passado. 

 Sem dar detalhes, as empresas preveem uma oferta competitiva de serviços de recarga para motoristas BYD, com descontos na rede Shell Recharge, e energia renovável para seus concessionários. 

Ampliar a infraestrutura de recarga é crucial para os planos de avanço da BYD, maior fabricante de carros elétricos do mundo – à frente da Tesla, de Elon Musk. A montadora chinesa também será a primeira a fabricar os veículos 100% elétricos no Brasil, em Camaçari (BA).  

“Acreditamos que é crucial ter uma infraestrutura de recarga robusta e amplamente distribuída. À medida que embarcamos no nosso ambicioso plano de expansão de vendas, é essencial investir em infraestrutura de recarga”, disse Stella Li, vice-presidente executiva da BYD e CEO da BYD Américas, em nota. 

As empresas não informam o volume investido. A parceria conta com a colaboração da Tupinambá Energia, plataforma para gestão  e controle do carregamento de veículos elétricos.


Fonte: https://capitalreset.uol.com.br/transicao-energetica/transportes/raizen-e-byd-se-unem-para-criar-pontos-de-recarga-de-carros-eletricos/

Hora da verdade no combate ao greenwashing

União Europeia adota novas regras de proteção ao consumidor que proíbem afirmar sem provas que produtos ou serviços são ‘carbono neutro’ ou ‘verde’

Por Caroline Dihl Prolo

 

Uma nova norma adotada pelo Parlamento Europeu pretende combater a prática de greenwashing e proteger consumidores de afirmações enganosas que fabricantes e comerciantes fazem sobre atributos ambientais, sociais e climáticos  de seus produtos e serviços.

A norma bane a utilização de adjetivos genéricos e de alegações não comprovadas sobre atributos socioambientais, e proíbe o uso de expressões como “carbono neutro” baseadas em compensação de emissões via compra de créditos de carbono.

A regulação é muito bem-vinda em um contexto de inconsistência entre as normas de autorregulação, ao mesmo tempo em que o greenwashing vem se disseminando e sendo duramente escrutinizado e combatido nos tribunais. Informação é poder, e o poder de escolha, seja sobre a compra de produtos, de serviços ou de ações de empresas em bolsa, é fundamental na transição para uma economia de baixo carbono, mais resiliente e justa.

 

A União Europeia não poderia ter criado um nome mais oportuno para sua proposta de diretiva: “Empoderando Consumidores para a Transição Verde” (“Empowering consumers for the green transition”).

Proteção do consumidor

A norma consiste de uma reforma na legislação atual de proteção do consumidor, por meio da alteração dos artigos 6 e 7 da Diretiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho. Ela foi adotada pelo Parlamento em 17.01.2024, mas ainda precisa ser aprovada pelo Conselho Europeu.

A norma vai ser complementar à Diretiva sobre Alegações Ambientais (“Green Claims Directive”) – em tramitação no Parlamento Europeu –, que será mais específica e abordará as condições para as alegações ambientais de forma mais detalhada.

A diretiva parte da premissa de que, para conciliar o bom funcionamento do mercado interno com um alto nível de proteção ao consumidor e de proteção do meio ambiente, e ao mesmo tempo avançar na transição ecológica, é essencial que os consumidores possam tomar decisões de compra informadas.

Em contrapartida, os comerciantes têm a responsabilidade de fornecer informações claras, relevantes e confiáveis. Do ponto de vista da concorrência, o objetivo da norma é permitir que os comerciantes operem em condições de igualdade e que os consumidores escolham produtos que sejam realmente melhores para o meio ambiente do que os produtos concorrentes.

Um dos destaques da norma é a proibição de alegações sobre metas futuras relacionadas a transição para neutralidade de carbono ou de emissões em uma determinada data. Tais alegações criariam a impressão de que os consumidores, ao adquirir tais produtos, estão contribuindo para uma economia de baixo carbono.
 
Provas

A diretiva requer que tais afirmações sejam baseadas em compromissos claros, objetivos, verificáveis e delineados em um plano de implementação detalhado, que preveja a devida alocação de recursos financeiros e seja disponibilizado ao público. Além disso, tais alegações devem ser verificadas por uma auditoria de terceira parte, também disponível publicamente.

Também ficam proibidas alegações genéricas sem um desempenho ambiental de excelência reconhecido que seja relevante para a alegação.

“Amigo do meio ambiente”, “verde”, “ecológico”, “biodegradável” e outras caracterizações do tipo são proibidas quando não for possível demonstrar um desempenho ambiental notoriamente excelente, por meio de um selo reconhecido, por exemplo.

É vedada também a exibição de selos de sustentabilidade que não sejam baseados em um sistema de certificação ou estabelecidos por autoridades públicas.

Eis um exemplo de uma afirmação permitida: “100% da energia usada para produzir esta embalagem provém de fontes renováveis”. Por outro lado, alegação considerada genérica também é a de produtos “sustentáveis”. Aqui não apenas há um problema com a necessidade de se comprovar essa excelência, mas também o fato de que esta alegação está relacionada tanto às características ambientais como às sociais de um produto.

Também são proibidas alegações de que um produto ou serviço tem um impacto neutro, reduzido ou positivo sobre o meio ambiente em termos de emissões de gases de efeito estufa, como o famoso “carbono neutro”, a partir de compensações de emissões. Segundo a diretiva, essas alegações dão a falsa impressão aos consumidores de que o consumo do produto não tem impacto ambiental.

Elas só são permitidas se forem baseadas no impacto real no ciclo de vida do produto inteiro, e não na compensação de emissões de gases de efeito estufa fora da cadeia de valor do produto, por meio da compra de créditos de carbono, por exemplo.

Créditos de carbono

Isso não significa que as empresas não possam investir em atividades fora da cadeia de valor, incluindo projetos de crédito de carbono, mas não podem atribuir a isso um papel de neutralidade dos impactos específicos do produto.

A Science-Based Targets initiative (SBTi) já vem também restringindo a abordagem de compensação com créditos de carbono como prática que tenha a capacidade de “neutralizar” as emissões de uma companhia dentro de seus planos de transição climática.

Para o SBTi, compensação é definida como “ações que uma empresa adota para oferecer mitigação fora de sua cadeia de valor como um substituto para a rápida redução das emissões da cadeia de valor”, mas as empresas não podem atingir suas metas baseadas na ciência por meio da compensação.

Por outro lado, a ABNT no Brasil adota entendimento diverso. A Prática Recomendada PR 2060 entende que a condição de carbono neutro pode incluir compensação de carbono, definida como “mecanismo pelo qual se compensa as emissões de GEE geradas em decorrência das atividades por meio de suas próprias reduções, remoções contabilizadas em seu inventário ou mediante aquisição de créditos”.

Nos tribunais

Em meio a essas inconsistências nas abordagens propostas pelos standards de mercado, dá para entender por que também as empresas possam ter dificuldades para não incidir em greenwashing.

A resposta a isso tem vindo na forma de um movimento intenso de casos de litigância de greenwashing. Conforme reportado pelo Grantham Research Institute no estudo anual Global trends in climate change litigation: 2023 snapshot, houve um crescimento de litígios de “climatewashing”.

Dentre eles, destacam-se os casos que questionam a veracidade dos compromissos climáticos corporativos, especialmente quando não são respaldados por planos e políticas adequados. Mas o maior número de casos envolve questionamentos sobre declarações ambientais relacionadas a produtos que alegam ser “carbono neutros”, incluindo casos em órgãos administrativos relacionados a direitos do consumidor e propaganda enganosa.

Dessas alegações, nem a ONU escapa. Investigação da The New Humanitarian em parceria com a agência de notícias Mongabay em setembro de 2023 questionou a integridade do compromisso de neutralidade climática da ONU, que teria afirmado ser pelo menos 95% neutra em todos os anos desde 2018, em grande parte por meio do uso de créditos de carbono.

Além de questionar a metodologia de compensação por meio de créditos de carbono, a matéria aponta que, desses créditos, mais de 2,7 milhões teriam sido emitidos por projetos que, segundo especialistas, não representariam reduções reais de emissões.

É importante olhar para a transição de baixo carbono sob a perspectiva da demanda. Quem compra produtos, quem usa créditos de carbono, quem investe em um negócio dito “carbono neutro” importa.

Essa demanda existe ou por razões regulatórias – leis e exigências governamentais – ou por uma escolha consciente dos atores de mercado, baseada na consciência ambiental e/ou na consciência dos riscos financeiros atrelados a mudança do clima.

Mas se esses agentes não tiverem as informações adequadas para exercer uma escolha consciente, o que acontece com a demanda por esses produtos/serviços/investimentos? A demanda vai simplesmente acabar porque as pessoas vão desistir de usar critérios ambientais para fazer suas compras? Será que essa consciência simplesmente vai desaparecer, ou os consumidores vão ficar cada vez melhores em identificar produtos vencedores, e o mercado vai se tornar mais competitivo, em uma corrida para o topo? Minha opinião é: o escrutínio só vai aumentar.

A regulação da União Europeia é um avanço mais do que necessário. Uma lei de prevenção ao greenwashing serve para guiar todos nós em um novo mercado em que atributos ambientais e climáticos em produtos, serviços e investimentos são desejados. Precisamos de harmonização dessas regras para garantir que a economia do consumo sustentável não vai piorar a situação do planeta.

Os desafios da taxonomia sustentável ainda são enormes, e os consumidores são os mais afetados. Mas também são os investidores, parceiros comerciais, cidadãos e eleitores. Informação é poder, e vai ajudar a sociedade e o mercado a melhorar e prosperar em um clima estável e um meio ambiente equilibrado.

Fonte: https://capitalreset.uol.com.br/regulacao/hora-da-verdade-no-combate-ao-greenwashing/

Desastres naturais geraram US$ 250 bi em perdas em 2023

Valor segurado, de US$ 95 bilhões, não chegou nem à metade do total; fortes tempestades puxaram aumento

Por Italo Bertão Filho.

O ano passado foi mesmo o mais quente em um século e meio de medições. Todas as regiões do planeta sofreram aumento nas temperaturas, que ficaram 1,48ºC acima do padrão registrado na era pré-industrial, de acordo com dados divulgados pelo monitor climático da União Europeia, o Copernicus, nesta terça-feira.

E a conta dos desastres naturais e eventos climáticos extremos também já chegou: foram cerca de US$ 250 bilhões em prejuízos no mundo todo, de acordo com um levantamento da Munich Re, a maior resseguradora do mundo.

A conta inclui terremotos devastadores que atingiram o leste da Turquia e a Síria, em fevereiro, e o Marrocos, em setembro.

 

Mas o destaque ficou com os eventos associados à mudança do clima. Tempestades causaram perdas de US$ 66 bilhões nos Estados Unidos e de US$ 10 bilhões na Europa. Desses totais, US$ 50 bi e US$ 8 bi estavam protegidos por seguros respectivamente, segundo a Munich Re.

“Pesquisas científicas indicam que a mudança climática favorece tempestades severas. Igualmente, as estatísticas de prejuízos com tempestades na América do Norte e em outras regiões apresentam tendência de alta”, afirmou o comunicado da resseguradora.

“A sociedade e a indústria precisam se adaptar aos riscos em transformação, ou as perdas vão inevitavelmente aumentar.” 

Os prejuízos cobertos por seguros foram de US$ 95 bilhões, montante que não chega nem à metade do total dos prejuízos. O volume superou a média da última década, que foi de US$ 90 bilhões.

Essa nova realidade está levando as seguradoras a repensar a classificação de riscos de tempestades, segundo a Bloomberg. O setor costumava categorizar os danos provocados pelas chuvas como de pequeno e médio porte.

Mas, com as tempestades mais extremas, a classificação pode mudar, o que poderia afetar também os valores envolvidos e as áreas em que são oferecidas apólices.

 

Fonte: Station

COP28 termina com acordo histórico para transição de fósseis

Conferência aponta caminho para o mundo pós-carbono pela primeira vez em três décadas; bloco do petróleo bloqueia linguagem mais incisiva

Por Sérgio Teixeira Jr.

DUBAI – Depois de caminhar perigosamente à beira do precipício, a COP28 foi encerrada na manhã desta quarta-feira em Dubai com a primeira menção a combustíveis fósseis em um documento oficial em quase 30 anos de conferências do clima.

O documento final fala em uma “transição que se afaste dos combustíveis fósseis, acelerando a ação nesta década crítica”. Os esperados termos “redução” (phase down) ou “eliminação” (phase out) ficaram de fora.

A pressão por uma declaração incisiva tinha apoio de europeus, americanos, brasileiros e dos países mais vulneráveis, mas não foi capaz de vencer a resistência dos países do cartel do petróleo, encabeçados pela Arábia Saudita.

As decisões dependem da concordância unânime de quase 200 países.

Mas o texto adotado é claro sobre a necessidade de alinhar os esforços globais com a ciência para limitar o aumento da temperatura de 1,5°C.

Havia a ameaça real de fracasso, dada a distância das posições. A solução possível foi listar oito ações que os quase 200 signatários da Convenção do Clima são chamados a tomar, respeitando as “diferentes circunstâncias nacionais”. São elas:

Triplicar as energias renováveis e dobrar a eficiência energética até o fim desta década;
Acelerar os esforços para reduzir o uso de carvão cujas emissões de CO2 não foram abatidas;
Acelerar os esforços globais para sistemas energéticos net zero, usando combustíveis de zero ou baixo carbono antes ou por volta da metade do século;
Fazer a transição que nos afaste dos fósseis nos sistemas energéticos de forma justa, ordenada e equitativa, acelerando a ação nesta década crítica;
Acelerar tecnologias de zero ou baixas emissões, incluindo entre outras as energias renováveis, nuclear, hidrogênio de baixo carbono e captura de carbono, particularmente nos setores de difícil descarbonização;
Reduzir substancialmente as emissões de metano até 2030;
Reduzir as emissões do transporte rodoviário, incluindo a infraestrutura para permitir carros de zero ou baixas emissões;
Eliminar gradualmente os subsídios aos combustíveis fósseis não associados à redução da pobreza energética ou a transição justa.
Esses itens compõem o 28º parágrafo do primeiro Balanço Global do Acordo de Paris, a decisão mais importante entre os vários da agenda de Dubai.

“Entregamos um plano de ação robusto para manter o [limite de] 1,5°C ao alcance”, disse o presidente da conferência, Sultan Al Jaber. “Não se enganem: é um pacote histórico para acelerar a ação climática.”

O balanço serve de guia para a próxima rodada de planos nacionais de descarbonização. Chamadas de NDCs, essas estratégias serão apresentadas até o início de 2025, ano da COP30, em Belém do Pará.

Em uma vitória importante da delegação brasileira, foi criado um grupo para incentivar mais ambição climática nas NDCs. O trabalho será conduzido pelas presidências da COP atual e das duas seguintes, Azerbaijão e Brasil.

A COP28 “indicou claramente a raiz do problema”, afirmou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. “Temos forte sinalização para governos e empresas que há compromissos assumidos por todos” em relação à transição energética.

Essa troika, que ela comparou à existente no G20, terá o objetivo de “traduzir [o Acordo de] Paris em ações concretas”.

Uma das diretrizes será incentivar NDCs que incluam todos os setores da economia e todos os gases que causam o efeito estufa, algo que não era requerido.

O governo brasileiro veio determinado a obter uma boa “divisão de responsabilidades” daqui até Belém, para que a COP da Amazônia não fosse uma “pororoca de problemas”, nas palavras de Silva.

Em Dubai houve o reconhecimento inédito da urgência da transição. No ano que vem, em Baku, o tema principal será o financiamento, ou os “meios de implementação”, na linguagem diplomática.

No Brasil, a ideia é consagrar as respostas ao diagnóstico do Balanço Global. “A tendência natural é que as COPs passem das negociações internacionais para a implementação”, diz Tulio Andrade, um dos negociadores brasileiros.

“Foram criados vários mecanismos, de contabilidade de emissões, de transparência, adaptação e assim por diante. Agora eles começam a se conectar de fato com as políticas domésticas de cada país.”

‘Consenso de Dubai’
O resultado da COP28, batizado de “Consenso dos Emirados Árabes Unidos”, inclui outras decisões importantes. No primeiro dia da conferência foi operacionalizado o fundo de perdas e danos para ressarcir os países pobres que já sofreram prejuízos causados pela mudança do clima. Resta saber se os países desenvolvidos de fato aportarão os recursos na magnitude necessária daqui em diante.

Também foi adotada a Meta Global de Adaptação, que inclui objetivos para que as nações se preparem para lidar com os efeitos já sentidos do aquecimento global, como ondas de calor e enchentes devastadoras.

Já sobre os mercados de carbono globais, negociados desde 2015, não houve acordo. O chamado Artigo 6 do Acordo de Paris volta a ser discutido no âmbito técnico ao longo do ano e será submetido de novo à COP.

As outras decisões quase tiveram o mesmo destino do Artigo 6. As últimas 36 horas quase colocaram tudo a perder.

Entre a noite de domingo e a plenária final, o presidente da conferência e as delegações ficaram reunidos a portas fechadas tentando salvar a COP28 de um rascunho inicial “ditado pela Opep”, na descrição do ex-vice-presidente americano Al Gore.

Uma nova versão foi divulgada no começo da manhã. Quando o martelo foi batido às 11h12 locais (4h12 em Brasília), a sala plenária explodiu em aplausos.

Mas a primeira manifestação de um país foi menos generosa. A representante de Samoa, falando em nome das ilhas e países mais ameaçados pela emergência climática, afirmou que o texto contém “um rosário de brechas” e que o progresso foi “incremental, não a mudança exponencial” necessária.

John Kerry, o enviado especial para o clima do governo americano, fez um diagnóstico realista: “Ninguém aqui vai ter suas opiniões completamente refletidas [na decisão], mas o fato é que este documento manda um sinal muito forte para o mundo.”

“Os governos estão finalmente abertos a lidar com o elefante na sala”, disse Andrew Deutz, diretor de políticas da ONG internacional The Nature Conservancy.

“Goste você ou não, a eliminação dos combustíveis fósseis é inevitável”, escreveu o secretário-geral da ONU, António Guterres, no X (antigo Twitter). “Tomara que não isso não aconteça tarde demais.”

Fonte: https://capitalreset.uol.com.br/clima/cop/cop28-termina-com-acordo-historico-para-transicao-de-fosseis/?utm_campaign=131223_-_cop_fim__blackrock__webinar_impulso_cop&utm_medium=email&utm_source=RD+Station

Depois do clima, é a vez da natureza entrar nos balanços

Força tarefa cria padrão de reporte de riscos e oportunidades criados para os negócios por recursos hídricos, biodiversidade e outros 

Por Sérgio Teixeira Jr.

 

Por iniciativa voluntária ou obrigação regulatória, grandes empresas do mundo todo estão aprendendo a medir e divulgar como a mudança climática afeta seus negócios.

Anos de desenvolvimento culminaram no ISSB, um padrão de reportes  climáticos para o setor financeiro que a CVM, o xerife do mercado de capitais brasileiro, adotou de forma pioneira há dez dias.

Mas os efeitos dos gases de efeito estufa não são o único fator de risco para os negócios. Um novo padrão de reporte, lançado há um mês e meio, quer colocar a natureza e a biodiversidade nos balanços corporativos, assim como o que vem acontecendo com o clima.

O objetivo da Task force on Nature-related Financial Disclosures (TNFD) é entender como os riscos e oportunidades relacionados à natureza podem afetar o negócio das empresas – e orientar as decisões dos investidores.

“A natureza já está nos avisando com muita urgência. Perda da biodiversidade, contaminações, espécies invasoras… Estamos ultrapassando os limites planetários”, diz ao Reset o colombiano Felipe Arango, que lidera os projetos-piloto da iniciativa.

No caso do clima, tudo pode ser reduzido ao denominador comum das toneladas de CO2 equivalente. Um dos desafios da natureza é a imensidão do universo a ser medido.

Arango diz que a força-tarefa identificou mais de 3 mil possíveis indicadores. No final, foram eleitas 14 métricas.

A parte difícil começa agora: convencer as companhias e reguladores a adotar as normas. Apesar da importância do tema – metade do PIB global depende de alguma forma de recursos naturais, segundo o Fórum Econômico Mundial –, o assunto é novo e se soma à já complexa tarefa de compreender como a mudança climática vai transformar os negócios.  

O órgão regulador – batizado de Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa, ou SBCE – fica responsável por determinar os setores da economia sujeitos a tetos de emissões e por conceder (ou vender em leilões) permissões de emissão às empresas.

Arango afirma que é necessário “abraçar a complexidade”. “É do interesse do setor corporativo e do setor financeiro jogar luz sobre suas dependências da natureza para analisar o quanto antes que capacidades, que planos existem. Porque os riscos e as oportunidades estão aí.”

Leia abaixo os principais trechos da entrevista concedida por Arango em uma recente passagem por São Paulo.

Qual é o objetivo do TNFD?

O propósito principal é o reconhecimento de que os fluxos financeiros podem gerar resultados positivos ou negativos para a natureza. E ela já está nos avisando com muita urgência. Perda da biodiversidade, contaminações, espécies invasoras… Estamos ultrapassando os limites planetários.

Os fluxos financeiros podem ser grande parte da solução ou acelerar o problema. A TNFD considerou que era necessário um marco global que permitisse dirigir [o capital] para afastá-lo dos resultados negativos e aproximá-lo dos positivos.

Para isso era necessário criar uma linguagem comum, uma série de definições, sobre o que é impacto na natureza, ou que é dependência, quais são os riscos ou as oportunidades associadas a ela e assim por diante.

Diria que no coração da TNFD estão as divulgações corporativas. Mas é um tipo diferente de divulgação, no sentido de que ela está focada nos supervisores financeiros, nos bancos centrais. Eles é que vão exigir do setor financeiro transparência sobre os riscos e as oportunidades relacionadas à natureza que ele financia.

É algo análogo à TCFD (Task force on Climate-related Disclosures), que fez o mesmo para o clima.

Sim, e aprendemos muito com eles, pois já existem legislações e regulamentações financeiras baseadas no trabalho da TCFD. Estamos conversando também com a IFRS e o ISSB, e eles já anunciaram publicamente que vão levar em conta o nosso trabalho.

Então, supervisores e os bancos centrais podem dar um passo além dos relatórios voluntários. Uma das coisas que me entusiasmam na TNFD é esse potencial de modificar a supervisão e modificar a contabilidade.

A TCFD já introduziu uma camada de complexidade de levantamento de informações que as empresas têm de divulgar. Agora vem algo potencialmente ainda mais complicado para as empresas. Isso não representa um risco para o sucesso do padrão?

Sempre acreditei que o exercício de relatar e o aprimoramento da gestão são duas faces da mesma moeda.

É do interesse do setor corporativo e do setor financeiro jogar luz sobre suas dependências da natureza, como uma lanterna, para analisar o quanto antes que capacidades, que planos existem. Porque os riscos e as oportunidades estão aí.

Tem os riscos físicos da natureza, que vão mudar as preferências dos consumidores para proteger a única casa que temos. E a legislação será cada vez mais exigente. Já estamos vendo isso na Europa.

O exercício de reportar deve ser visto com a lente de aprimorar a gestão, identificar brechas e desenvolver planos para avançar e proteger sua criação de valor.

E qual é a expectativa de que essas divulgações sobre impactos da natureza sobre os negócios também se tornem obrigatórias, como tem acontecido com os reportes climáticos?

Cada jurisdição, assim como no caso do TCFD, vai definir com seus processos políticos próprios. Desenvolvemos o padrão para que possa ser utilizado de maneira voluntária.

Temos visto o interesse de várias delas agora que começa a fase de adoção, aproveitando o ímpeto gerado pela COP15 [a COP da Biodiversidade] e pela Meta 15 do Marco Global de Biodiversidade.

[A Meta 15 do “Acordo de Paris para a Biodiversidade” prevê que os 196 países signatários do documento incentivem instituições financeiras e empresas, especialmente as de grande porte e multinacionais, a reportar seus riscos, dependências e impactos na biodiversidade.

Algumas jurisdições já manifestaram interesse em ser pioneiras, em estabelecer obrigatoriedade, e outras vão começar com reportes voluntários.

Não posso mencionar exatamente quais, porque estão em fase de pilotos, mas alguns bancos centrais já estão aplicando a TNFD para seus próprios investimentos. Então, acho que essa bola de neve vai começar.

No clima tudo é reduzido a uma única unidade, que são as toneladas de carbono equivalente. Quais são os indicadores para a natureza?

A natureza é complexa por definição. A interação entre os diferentes âmbitos da natureza é complexa. A atmosfera, os oceanos, o sol, o solo saudável, a água fresca, tudo está interagindo permanentemente em um sistema cheio de complexidades, cheio de interações, cheio de ciclos de retroalimentação.

Se a gente quer ter resultados positivos com a natureza, tem que abraçar essa complexidade. Ou seja, isso não pode ser um incentivo para a paralisia. Tentamos simplificar da melhor maneira possível, mas reconhecendo que a complexidade vai existir.

Identificamos mais de 3 mil métricas. Nas recomendações finais, chegamos a 14 métricas.

São métricas muito alinhadas aos motores das mudanças na natureza, como mudança do uso da terra [desmatamento para abrir novas áreas de plantação], extração de recursos naturais, contaminação etc. E também temos métricas relacionadas aos riscos e às oportunidades relacionadas com a natureza.

São indicadores core que se aplicam à maioria das empresas e que podem ser considerados pelo setor financeiro na hora de analisar as atividades que financia. São dados que podem ser relevantes para a história que os portfólios vão contar.

E como podemos compará-los, já que muitos deles estão associados a regiões específicas?

Sim. Uma tonelada de dióxido de carbono na Índia é igual a uma tonelada de dióxido de carbono na Colômbia. Elas vão para a mesma atmosfera.

Mas a extração de água de um reservatório em São Paulo é muito diferente da extração de água de um reservatório na Cidade do Cabo. Neste caso, você precisa levar em conta os diferentes níveis de estresse hídrico de cada região.

Não estamos procurando uma bala de prata. O importante é como as empresas contam a história em sua governança, em sua estratégia, em seus sistemas de gestão, em suas métricas e objetivos.

Para que seu negócio continue gerando valor para a sociedade, para os acionistas e para os stakeholders, você precisa entender essa complexidade, tem que administrá-la.

Mas com um indicador único do clima, a tonelada de carbono, o setor financeiro ainda faz pouco. É só olhar para o financiamento de combustíveis fósseis…

É um bom ponto. Mas a mudança depende de outras dinâmicas além do número de métricas e da complexidade.

Tem a aceleração de mudanças nas preferências dos consumidores, e não só nos produtos e serviços que eles consomem. Os fundos de pensão investem o dinheiro dessas pessoas.

Não acho que o setor financeiro não tenha avançado suficientemente rápido na transição energética pelo número de indicadores ou a complexidade. Temos subsídios governamentais também.

Tenho certeza de que, mesmo com a complexidade, podemos abordar água fresca, solo, oceano e atmosfera de uma forma integrada e para que cada empresa possa contar sua história e transformar seu modelo de negócio. E que a sociedade possa tomar melhores decisões de investimento e de consumo.

A TNFD fez alguns projetos-piloto. Você poderia dar um exemplo do que o padrão representa na prática?

Fizemos 250 pilotos em todas as geografias, incluindo empreendimentos indígenas no México. Vou falar de um exemplo do setor financeiro e outro de empresa.

Um piloto muito interessante foi num fundo de pensão público na Escandinávia, que começou a fazer o exercício para entender como eles estão gerenciando riscos e oportunidades relacionados à natureza.

Eles dividiram o portfólio por assuntos e o examinaram com uma lupa. Quais das empresas têm risco associado ao desmatamento? E de contaminação de plásticos?

A partir daí começaram a ter outro tipo de conversa com essas empresas.

No setor corporativo, uma grande farmacêutica fez todo o exercício de aplicação da nossa metodologia e vai passar a publicar de forma integrada seus relatórios TCFD [clima] e TNFD [natureza].

Eles descobriram que o risco de natureza era maior que o climático, por causa da ameaça de colapso de ecossistemas e da eventual perda de licença para operar em comunidades de cujos insumos a companhia depende.

Podemos enxergar no futuro um único padrão que inclua clima e natureza?

Sim. Não vamos chegar ao net zero sem soluções baseadas na natureza, sem acabar com o desmatamento. A máquina mais poderosa que temos de eliminação de gases de efeito estufa hoje é a natureza.

A Terra é um sistema único. E nas empresas a governança também será a mesma. Se você tiver um fornecedor de alimentos, não vai querer saber só que tipo de energia ele usa, mas se ele desmatou, que fertilizantes usa, como está a saúde do solo.

Ninguém desenvolve um novo produto para o clima e outro para a natureza. A integração é natural.

Como vou ganhar o mesmo dinheiro dependendo menos da natureza? Como faço com mais circularidade? Como substituo certos insumos? É um olhar muito mais holístico e muito mais profundo, que vai ao coração do modelo de negócio.

Por mais que seja tudo interdependente, a crise climática parece dominar todas as atenções. Isso é um motivo de preocupação?

Talvez por ser mais fácil medir o consumo de energia, gases de efeito estufa e métricas de equivalência de CO2, o clima foi o primeiro a se priorizar.

Mas isso é positivo, não uma preocupação. Estamos aproveitando o que já se construiu ao longo dos últimos anos. E a natureza está no centro das atenções, vimos isso na recente Semana do Clima, em Nova York (realizada em setembro).

O Brasil tem uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, e acesso a vastos recursos naturais. Os reportes de natureza parecem uma grande oportunidade para as empresas daqui, não?

Sem dúvida. Existe uma enorme oportunidade para países mega biodiversos como o Brasil ou a Colômbia. É o nosso principal ativo e onde temos um diferencial competitivo em comparação com o resto do mundo.

O capital natural é a oportunidade para que os modelos de negócio e o setor financeiro do Brasil estejam um passo à frente. Transparência e evolução na gestão vão proteger esse capital natural.

E você vai poder atrair o capital financeiro internacional. Eu poderia te mostrar todos os fundos de pensão, fundos soberanos, grandes investidores que se comprometeram a gerar resultados positivos para a natureza.

As empresas que podem mostrar esses resultados de conservação, de regeneração ou de modelos de negócio positivos para a natureza estão em nossos países.

Não se trata mais de fluxos financeiros interessados em mão-de-obra mais barata. Agora podemos competir cuidando do nosso principal ativo.

Fonte: https://capitalreset.uol.com.br/regulacao/depois-do-clima-e-a-vez-da-natureza-entrar-nos-balancos/?utm_campaign=31102023_-_tnfd__engie_unipar&utm_medium=email&utm_source=RD+Station

Todos setores entram no mercado de carbono, diz secretária de Mudança do Clima

Segundo Ana Toni, a lógica da regulação de emissões será por volume de gases lançados na atmosfera; agro está contemplado

Por Vanessa Adachi

 

A maioria dos mercados regulados de carbono mundo afora opera com uma lógica setorial. Ou seja, os setores intensivos em carbono que precisam ter suas emissões limitadas fazem parte do mercado regulado. 

Segundo Ana Toni, secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, no Brasil o princípio será outro. “A proposta de mercado regulado que está no Senado não tem um olhar setorial, mas sim em termos de limites de emissões”, disse ela ao Reset, por telefone, a partir de Nova York, onde integra a comitiva do governo brasileiro que participa da Semana do Clima. 

Ou seja, independentemente do setor de atividade, os maiores emissores terão um teto a respeitar. 

Segundo Toni, isso contempla inclusive a agropecuária, uma das grandes dúvidas que pairam hoje no mercado sobre o esquema de redução de emissões proposto.

Na avaliação do governo, que elaborou o substitutivo ao projeto de lei apresentado e relatado pela senadora Leila Barros (PDT-DF), “não importa qual o setor de atividade, é melhor olhar para valores emitidos. Dentro de todos os setores há quem emite pouco e quem emite muito”.

O texto prevê que limites serão impostos a negócios que lancem mais de 25 mil toneladas de CO2 equivalente por ano.

O entendimento entre especialistas é que a definição dos setores integrantes do mercado brasileiro seria feita numa etapa posterior de regulamentação. A abordagem seria progressiva, começando pelos setores de maior intensidade de carbono e aqueles em que há mais ferramentas de medição e controle – indústrias pesadas, como siderurgia e energia, por exemplo.

Nenhuma outra jurisdição impõe limites de carbono ao agronegócio. Mas o perfil das emissões brasileiras é distinto do de outros mercados, com uma forte participação das atividades agropecuárias no volume de gases lançados na atmosfera. 

Encontrar o equilíbrio entre a pressão dos ambientalistas, que querem regular o carbono emitido pelo agro, e os produtores, uma grande força exportadora representada pela poderosa bancada ruralista no Congresso, é um dos pontos que podem selar o destino do PL. 

O senador Zequinha Marinho (Podemos-PA) apresentou emendas ao texto sugerindo a criação de um terceiro tipo de ativo negociado, as remoções líquidas de gases de efeito estufa.

Nos mercados já operantes, e também no projeto em discussão, existem dois ativos: as “permissões para poluir”, concedidas pela autoridade reguladora, e as reduções obtidas pelas empresas que fizeram o dever de casa. 

Um participante do mercado que emite além das permissões concedidas pelo regulador pode “fechar a conta” comprando as sobras de outra empresa que foi além de suas metas.

A emenda sugerida por Marinho abre espaço para que o agronegócio, em vez de ser penalizado, se beneficie da legislação. O setor emite e sequestra carbono ao mesmo tempo. Dependendo da como for contado o saldo de carbono, os produtores poderiam se tornar vendedores no mercado regulado.

Ana Toni diz que “as metodologias que fazem a contagem de gases estão mais atrasadas no agro do que, por exemplo, no setor de energia” e que é preciso que tudo isso esteja bem estabelecido para que o sistema seja equilibrado.

Uma vez redefinido o orçamento de carbono do país, diz Toni, o grupo de trabalho sobre o Plano Clima, dentro do CIM, terá a atribuição de definir os cenários de emissões para setores da economia e também desenhar planos e acordos para se chegar lá.

Desse GT sairão 8 planos setoriais para mitigação da emissão de gases e 14 planos de adaptação à mudança climática.

Em mitigação, os planos serão dos setores de mudança do uso da terra, agricultura e pecuária; cidades, energia, indústria, mineração, resíduos e transportes. Em adaptação estão contemplados agricultura, pecuária, biodiversidade, cidades, gestão de risco e desastres, indústria, energia, povos e comunidades tradicionais, população negra e povos indígenas, recursos hídricos, saúde, segurança alimentar, oceano e zonas costeiras e transportes.

A ideia é que os planos sejam apresentados até, no máximo, janeiro de 2025. Na sua visão, com cinco anos a partir disso para começar a entregar reduções, o prazo não é apertado.

“Claro que perdemos tempo nos últimos quatro anos. Mas o Brasil não está saindo do zero na corrida para descarbonizar. Já tem planos como o PPCDAm e o PPCerrado, além de planos para o setor de energia que estão sendo implementados. Mas queremos saber se podemos ser mais ambiciosos e detalhistas, qual a curva de descarbonização e quão acentuada ela pode ser.”

A ideia, diz ela, é começar olhando para intervalos de orçamentos de emissão para cada setor, trabalhar nos planos setoriais e ver se a conta do orçamento geral fecha ou se podem ser mais ambiciosos.

Segundo Toni, esse processo de construção dos planos será bastante participativo. “Todos os planos irão para consulta pública. E os ministérios que estão a cargo dos planos setoriais farão uma construção junto ao setor privado, academia e organizações da sociedade civil. A inteligência coletiva é sempre melhor do que uma única.”

A próxima reunião do CIM está marcada para novembro, para que o governo chegue alinhado à cúpula do clima em Dubai, a COP28.

 

Fonte:  https://capitalreset.uol.com.br/agronegocio/agro-entra-no-mercado-de-carbono-diz-secretaria-de-mudanca-do-clima/?utm_campaign=19092023_-_ana_toni_-_mercado_regulado&utm_medium=email&utm_source=RD+Station

A transição ecológica do Brasil depende da política macro

Não podemos ter expectativa de um boom de investimentos verdes no país sem o compromisso claro com o retorno ao grau de investimento

Por Winston Fritsch

 

O governo parece finalmente ter completado o desenho de sua política de transição ao baixo carbono, com o anúncio do chamado Plano de Transição Ecológica previsto para ser lançado já no segundo semestre de 2023. 

Esta política começou a ser desenhada desde o início da nova administração, com a implementação de um esquema de governança “transversal” da política climática, com secretarias focadas na transição nos ministérios-chave e um ataque intransigente ao desmatamento ilegal da Amazônia, responsável por cerca de metade das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, que nos dão a nada invejável posição de 5º maior poluidor do mundo.

Agora, o governo completa o trabalho ao encaminhar um substitutivo aos projetos de lei há muito em discussão no Congresso, propondo regras para a precificação eficiente das emissões de carbono – requisito fundamental de qualquer política de clima – e lança o chamado Plano de Transição Ecológica que, embora ainda seja apenas uma vasta lista de intenções, deve, segundo o ministro da Fazenda, produzir um conjunto de incentivos ao investimento de impacto climático e “ser a grande marca do terceiro mandato de Lula”.

O desenho de instrumentos para incentivar investimentos de impacto climático – centrados na eletrificação verde e sua infraestrutura – não exige muita criatividade. Existe consenso de que deva ser um tripé de instrumentos formado por precificação do carbono (como o sistema europeu), incentivos fiscais temporários focados em projetos e atividades de impacto (como o IRA americano, em nosso caso possivelmente mais centrado em incentivos ao investimento) e, por último, mas essencial, um ambiente onde o setor privado seja atraído para financiar esses investimentos. 

O principal problema está no desenho desse último objetivo: qual o tamanho da conta e de onde virá o dinheiro? 

Estimativas das necessidades de investimento na transição climática dos países em desenvolvimento e do papel central do investimento privado nesses fluxos variam, mas estão convergindo. Se usarmos um número recente e de grande autoridade, produzido pelo Grupo Independente de Especialistas criado pelo G20, veremos que, para cumprir os objetivos do Acordo de Paris, os países em desenvolvimento (excetuando-se a China) teriam que elevar até 2030 seus investimentos de impacto climático – ou seja, fazer investimentos adicionais – em US$ 1.8 trilhão, na maior parte em infraestrutura. Isto representa nada menos do que quadruplicar o nível de investimentos existente em 2019. 

Deste total, estima-se que cerca de US$ 500 bilhões viriam das chamadas Instituições de Financiamento do Desenvolvimento, a rede de bancos multilaterais e nacionais de fomento que, naturalmente, teria que ser reformada para prover este volume. 

O restante dessa enorme despesa de capital, mais de US$ 1 trilhão, terá que vir de investidores privados. E a maior parte disso em financiamentos externos do conjunto de bancos e enormes gestoras de ativos globais que gira em torno do sol de Wall Street.  Como dizem por lá, no small thing.

Para responder a esse desafio, o Banco Mundial acaba de criar o que chamou de Private Sector Investment Lab – uma iniciativa a ser liderada por um grupo de 15 CEOs de grandes instituições financeiras privadas internacionais – visando criar soluções inovadoras para promover o investimento do setor privado em investimentos de impacto climático em países menos desenvolvidos. 

O Lab já está em ação e deverá se concentrar inicialmente em escalar o volume de transition finance voltado para energias renováveis e infraestrutura energética. Ou seja, as engrenagens começam a se mexer para endereçar o que até hoje tem sido a parte mais desafiadora da solução do problema do aquecimento global: trazer o setor financeiro privado dos países desenvolvidos para a mesa. 

Atrair investimentos privados não deveria ser difícil para economias que possuem recursos naturais que lhes permitam gerar oportunidades rentáveis de investimento em energia verde, como o Brasil. 

Entretanto, a percepção de risco do mercado internacional faz com que um projeto no Brasil, com taxa interna de retorno não alavancada equivalente ao de um projeto, digamos, europeu, se torne não competitivo na atração de investimento por ter um custo de financiamento internacional vários pontos de percentagem superior ao do projeto europeu.

Esta distorção existe por duas razões. A primeira, muito importante em projetos de eletrificação, existe porque a energia elétrica é, em geral, um bem produzido para o mercado interno e, portanto, existe risco cambial para o investidor estrangeiro. E os custos de cobertura de risco (hedge) cambial cobrados para financiamento de projetos em países emergentes pelos bancos internacionais são altos e cíclicos, fruto de uma miopia do mercado internacional de capitais empiricamente demonstrável, que amplifica desproporcionalmente o impacto de estresses financeiros correntes na avaliação do risco de longo prazo.

É por isso que os primeiros anúncios da criação do Lab do Banco Mundial foram provocados por esse tema e pela ideia de criação de um fundo segurador para minimizar este risco, sobre o qual escrevi em recente artigo no Valor Econômico.

Entretanto, no Brasil, o potencial de geração de energia limpa eficiente é muito superior à demanda doméstica projetada nas próximas décadas, o que permite que se pense realisticamente em liderarmos a transição à era do hidrogênio verde, transformando elétrons baratos em moléculas exportáveis sob múltiplas formas. Isto permitiria realizar estes grandes projetos sem risco cambial relevante, pois projetos deste tipo têm um hedge natural em suas receitas denominadas em dólares.

Mas, infelizmente, ainda permanecerá o obstáculo principal ao financiamento externo privado de projetos de infraestrutura no Brasil: o alto prêmio de risco de longo prazo do país, resultante das percepções de mercado sobre a instabilidade do arcabouço da política monetária e fiscal do país.

Especialmente no quadro atual de contração de liquidez global e de tensões geopolíticas, não podemos, realisticamente, ter a expectativa de um boom de investimentos verdes no Brasil se a política macroeconômica não tiver compromisso claro com a meta de perseguir o retorno ao grau de investimento.

A alternativa seria estimular os investimentos com recursos públicos, distribuindo subsídios desnecessários e comprometendo ainda mais o equilíbrio fiscal de longo prazo.

Em outras palavras, se a grande marca a ser deixada pelo terceiro mandato de Lula, como diz o ministro da Fazenda, será ter estimulado uma onda de investimentos na transição ao baixo carbono, a prioridade deste governo deverá ser a execução de uma política macroeconômica que acelere a queda do risco país, complementada pela criação de um ambiente regulatório de primeiro mundo.  

Winston Fritsch é PhD em Economia pela Universidade de Cambridge, foi Decano do Centro de Ciências Sociais da PUC-Rio e Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Tem longa atuação na gestão de instituições financeiras e é Conselheiro Emérito do CEBRI.

 

Fonte:  https://capitalreset.uol.com.br/financas/a-transicao-ecologica-do-brasil-depende-da-politica-macro/?utm_campaign=12092023_-_winston__incendio&utm_medium=email&utm_source=RD+Stationhttps://capitalreset.uol.com.br/financas/a-transicao-ecologica-do-brasil-depende-da-politica-macro/?utm_campaign=12092023_-_winston__incendio&utm_medium=email&utm_source=RD+Station

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